Cinco horas da tarde, o sol já começa a traçar seu caminho rumo ao oeste e seu fraco brilho vai vagarosamente dando lugar a escuridão da noite, na Estação Dom Pedro II as plataformas se encontram repletas de trabalhadores cansados, sujos e suados, mais um dia de trabalho se foi e depois de tudo o que passaram só o que eles querem é encontrar um lugar sentado dentro do trem. Pelo auto-falante o locutor anuncia: “Próximo trem com destino a Japeri dará entrada na plataforma oito linha agá, horário previsto de partida às dezessete horas e dez minutos”. Nas plataformas os cansados representantes da força de trabalho brasileira se aproximam da faixa amarela e ficam esperando enquanto ao longe com seus fortes faróis acesos o trem se aproxima. Ao finalmente parar e abrir as portas, os embora cansadas trabalhadores ainda encontram força para correr o suficiente para sentar, uma correria louca e frenética que vale o grande prêmio do dia, o direito de voltar para casa sentado.
Nos bancos dos trens o cansaço é tanto que seus já acostumados passageiros nem se importam de ficar de olhos abertos, descansam e confiam em algum sexto sentido desconhecido que parece os avisar quando a estação certa chegar. Em meio ao aperto dos já também cansados vagões, camelôs se apertam entre os passageiros vendendo de tudo que se possa imaginar, capas para celular, cortadores de legumes, DVDs, chaveiros, prendedores de cabelo, picolé, cerveja, refrigerante, água e afins. Corpos também cansados e com as colunas tortas de tanto carregar as pesadas caixas de isopor repletas de gelo e algo mais, indo de um lado para o outro, trocando de vagão a cada estação tentando ganhar o pão deles de cada dia. Em meio a tantas vozes grossas e corpos altos uma voz ainda um tanto quanto aguda que habita em um corpo pequeno chama atenção, tão jovem é o menino e tão grande é o peso que carrega. Ele vem tentando se equilibrar enquanto o trem balança de um lado para outro em cada curva, sem contar com os diversos solavancos devido aos trilhos nada retilíneos da Estrada de Ferro Central do Brasil. Em seu rosto o suor lhe dá um brilho triste que chama ainda mais a atenção, seus olhos estão bem abertos, atentos para uma mão que possa se levantar e seus ouvidos também atentos para qualquer voz que possa chamá-lo. Alguém o vê e diz “vai pra escola moleque”, mas não há tempo para escola, pois é preciso ser homem na hora em que ele só queria poder ter o direito de ser menino. Sua caixa de isopor já surrada e repleta de fita adesiva entorta a coluna do menino e guarda em si diversas latas de refrigerante e garrafas d’água, ele como exemplo vivo de Atlas da sociedade moderna carrega o peso de seu mundo em seus ombros. Eu me pergunto se na já lotada caixa do menino ainda há espaço para sonhos, se ainda espaço para esperança. Será que já com essa vida tão ditadora e cruel ainda existe espaço para ele querer ser jogador de futebol, bombeiro, estudante, menino?
É triste ver como a vida acontece tão cedo e de forma tão abrupta para uns e os tira a oportunidade de poder crescer a seu próprio passo, é possível ver nos olhos desse e de tantos outros meninos do trem um sentimento gritante de tristeza, é possível ver que eles queriam estar em qualquer outro lugar, menos ali. Triste também é ver que fora do trem nas tantas escolas que vemos por aí tantos outros meninos e meninas que podem estar ali simplesmente levam a escola como brincadeira e não dão o devido valor a essa coisa maravilhosa que é a educação. Talvez, se pelo menos por algumas horas eles pudessem estar na pele do menino do trem com certeza dariam muito mais valor ao ensino e sentiriam uma sensação totalmente diferente no momento em que acordam e somente tem que se preocupar em qual roupa vestir para mais um dia de escola, brincadeiras, lan house e casa.
Muuuito bom! Congrats!
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